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Muitos de nós frequentaram ou assistiram programas antidrogas na escola, por exemplo, o Programa Educacional de Resistência às Drogas, ou PROERD.
Iniciativas deste tipo são sempre interessantes e importantes, mas será que funcionam?
De acordo com pesquisas científicas, os programas que dependem de educação e de táticas de intimidação são ineficazes e pouco fazem para reduzir o uso de drogas entre crianças em maior risco.
Isso não significa que devemos abandoná-los – apenas precisamos modificá-los. Um novo programa antidrogas testado na Europa, Austrália e Canadá chamado “Preventure” pode nos mostrar o caminho.

Os quatro traços

O programa, desenvolvido por Patricia Conrod, professora de psiquiatria na Universidade de Montreal, leva em conta como o temperamento de uma criança afeta seu risco para o uso de drogas – e que traços de personalidade criam diferentes caminhos para o vício.
Os primeiros estudos com o programa mostram que seu teste de personalidade pode identificar 90% das crianças em maior risco.
Reconhecendo que a maioria dos adolescentes que experimentam álcool, cocaína e outras drogas não se tornam viciados, o programa se concentra no que é diferente entre a minoria que de fato se torna dependente.
Essas são as quatro características que aumentam o risco de uma criança ou adolescente se viciar em drogas:
  1. Busca por adrenalina;
  2. Impulsividade;
  3. Sensibilidade à ansiedade;
  4. Desesperança.

Saúde mental

Uma criança que começa a usar drogas por um sentimento de falta de esperança, por exemplo, tem um objetivo completamente diferente do que aquela que procura emoções (a busca por adrelina).
Três dos quatro traços de personalidade identificados pelo Preventure (os três últimos) estão ligados a problemas de saúde mental, um fator de risco importante para o vício. Impulsividade, por exemplo, é comum entre pessoas com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, enquanto a desesperança é frequentemente um precursor da depressão. Sensibilidade à ansiedade, que significa ser excessivamente consciente e ter medo de sinais físicos de ansiedade, está ligada ao transtorno de pânico.
Enquanto a busca por adrenalina não está ligada a outros diagnósticos, aumenta o risco de dependência pela razão óbvia de que as pessoas atraídas por experiências intensas provavelmente curtem a sensação que as drogas trazem.

Entendendo os traços e sua relação com o vício

É importante ressaltar que a maioria das crianças em situação de risco podem ser identificadas cedo.
Por exemplo, Maia Szalavitz, autora de “Unbroken Brain: A Revolutionary New Way of Understanding Addiction” (em tradução livre, “Cérebro Desquebrado: Uma Nova Forma Revolucionária de Entender o Vício”), conta que recebeu um diagnóstico de déficit de atenção na pré-escola, o que aumenta o risco de toxicodependência por um fator de três.
Sua dificuldade de regular emoções e a sensibilidade excessiva fizeram com que ela fosse frequentemente caçoada por colegas. Em seguida, o isolamento a levou ao desespero.
Logo, quando seu professor de saúde lhe disse que a pressão dos colegas poderia fazê-la usar drogas, o que ela entendeu foi “drogas fazem de você popular”.

Como funciona o Preventure

Preventure começa com um treinamento de três dias para professores, que recebem um curso intensivo em técnicas de terapia comprovadas para combater problemas psicológicos.
Quando o ano escolar começa, os alunos fazem um teste de personalidade para identificar os traços em risco. Meses mais tarde, duas oficinas de 90 minutos – enquadradas como uma forma de canalizar a sua personalidade para o sucesso – são oferecidas para toda a escola. Esmagadoramente, a maioria dos estudantes se inscreve.
Embora a seleção pareça aleatória, apenas aqueles com valores extremos no teste – que capta com sucesso 90% das pessoas em risco – realmente participam, uma vez que as vagas são limitadas. Eles recebem o workshop voltado para a sua característica mais problemática – as oficinas ensinam os alunos técnicas cognitivas para lidar com problemas emocionais e comportamentais específicos.
A razão para a seleção não é inicialmente revelada. Se os alunos perguntam, eles recebem informações honestas; no entanto, a maioria não pergunta e acha o curso útil e relevante.
“Não há rotulagem”, explica a Dra. Conrod. Isso reduz as chances de que as crianças façam da etiqueta de “alto risco” uma profecia autorrealizável.

Resultados animadores

Preventure foi testado em oito ensaios clínicos randomizados na Grã-Bretanha, Austrália, Holanda e Canadá. Em todos os casos, foram vistas reduções no consumo excessivo de álcool, frequência do uso de drogas e problemas relacionados ao álcool.
Um estudo de 2013 publicado na revista JAMA Psychiatry incluiu mais de 2.600 alunos de 13 e 14 anos de idade em 21 escolas britânicas, metade dos quais participaram do programa. No geral, Preventure cortou o consumo de álcool nas escolas selecionadas em 29%, mesmo entre os alunos que não participaram das oficinas. Entre as crianças de alto risco, o consumo excessivo de álcool caiu 43%.
De acordo com a Dra. Conrod, o Preventure provavelmente afetou não participantes reduzindo a pressão que alunos de alto risco podiam exercer nos colegas para que eles bebessem também. Ela ainda suspeita que a formação de professores os tornou mais empáticos em relação aos estudantes de alto risco, o que deve ter aumentado o envolvimento da escola, um fator conhecido por cortar o uso de drogas.
Um estudo de 2009 também mostrou que Preventure reduziu os sintomas de depressão, ataques de pânico e comportamento impulsivo. Isso tem o potencial de mudar a trajetória de diversas pessoas, de uma que levaria à tragédia para uma que leva ao sucesso. [NyTimes]