Em 1880, uma mulher de meia-idade fez uma visita ao neurologista francês Jules Cotard, queixando-se de uma situação incomum. Ela tinha certeza que estava “sem cérebro, sem nervos, sem tórax, sem estômago, sem intestinos”. Senhorita X, como Cotard apelidou a paciente em suas notas, disse ao médico que julgava ser “apenas um corpo em decomposição”. Ela não acreditava na existência de Deus, nem de Satanás, tampouco contava ter uma alma. Como “não podia morrer de morte natural”, não tinha “necessidade de comer”,  eram outras afirmações da estranha mulher. Mais tarde, a Senhorita X morreu de fome.



Embora essa condição peculiar tenha se tornado conhecida como Delírio de Cotard, o neurologista francês não foi o primeiro a descrevê-la. Em 1788, quase 100 anos antes, Charles Bonnet relatou o caso de uma mulher idosa, que preparava uma refeição em sua cozinha, quando uma lufada de ar 'a golpeou com força no pescoço' paralisando um dos lados do corpo, como se ela tivesse sofrido um acidente vascular cerebral. Assim que recuperou a capacidade de falar, a anciã exigiu que suas filhas  “a envolvessem em uma mortalha e a colocassem em seu caixão”, porque julgava estar morta de fato.

A ‘mulher morta’ ficou agitada e começou a repreender seus amigos vigorosamente pela negligência deles em não conceder a ela este último favor; e como continuaram hesitando, a mulher se tornou extremamente impaciente e, com ameaças, começou a pressionar sua empregada para vesti-la como uma pessoa morta. Com o passar dos dias, todo concordaram que era necessário trajá-la como um cadáver e colocá-la no caixão, a fim de acalmá-la. A velha senhora tentou expressar um olhar tão puro quanto possível, vistoriou as dobras e pinos do ataúde, inspecionou a costura da mortalha, mostrou insatisfação com a brancura de sua roupa. No final de tudo, ela adormeceu profundamente, em seguida, foi despida das vestes mortuárias e colocada na cama.
Na esperança de quebrar o transe, um médico ficou à cabeceira, administrado um “pó de pedras preciosas misturado com ópio”. A mulher, finalmente despertou do seu estado delirante; no entanto, a cada três meses, ela voltava a surtar, isso continuou pelo resto de sua vida. Durante os períodos em que pensava estar morta, “ela conversava com pessoas que tinham falecido há muito tempo, preparava jantares para elas e as hospedava”.

Síndrome de Cotard