Segundo novas observações feitas por uma equipe internacional, o cometa Lovejoy é quase uma caiprinha ambulante, liberando grandes quantidades de álcool, bem como um tipo de açúcar, no espaço. A descoberta marca a primeira vez que álcool etílico, o mesmo tipo presente nas bebidas alcoólicas, foi observado em um cometa. A descoberta reforça a evidência de que os cometas poderiam ter sido uma fonte de moléculas orgânicas complexas necessárias para o surgimento da vida.
“Descobrimos que cometa Lovejoy libera quantias de álcool equivalentes a pelo menos 500 garrafas de vinho a cada segundo durante seu pico de atividade”, conta ao site Phys.org Nicolas Biver, do Observatório de Paris, principal autor de um artigo sobre a descoberta, publicado na revista “Science Advances”. A equipe descobriu 21 moléculas orgânicas diferentes no gás do cometa, incluindo álcool etílico e glicolaldeído, um açúcar simples.
Os cometas são restos congelados da formação do nosso sistema solar. Os cientistas se interessam por eles porque são relativamente intocados e, portanto, mantém pistas sobre como o sistema solar foi feito. A maioria orbita em zonas geladas longe do sol. No entanto, ocasionalmente, uma perturbação gravitacional manda um cometa mais para perto do Sol, onde se aquece e libera gases, permitindo aos cientistas determinar a sua composição.
O cometa Lovejoy (formalmente catalogado como C/2014 Q2) foi um dos cometas mais brilhantes e mais ativos desde cometa Hale-Bopp, em 1997. O Lovejoy passou mais próximo do sol em 30 de janeiro deste ano, quando liberava água a uma taxa de 20 toneladas por segundo. A equipe observou a atmosfera do cometa aproximadamente nesta época em que estava mais brilhante e mais ativo. Eles observaram um brilho de microondas do cometa usando um radiotelescópio de 30 metros de diâmetro no Pico Veleta, nas montanhas de Sierra Nevada, na Espanha.

Microondas múltiplas

A luz solar energiza moléculas na atmosfera do cometa, levando-as a brilhar em frequências de microondas específicas (se as microondas fossem visíveis, diferentes frequências seriam percebidas como cores diferentes). Cada tipo de molécula brilha em frequências específicas, como uma assinatura, permitindo que a equipe as identifique com detectores do telescópio. O equipamento avançado foi capaz de analisar uma vasta gama de frequências simultaneamente, permitindo que a equipe determinasse os tipos e quantidades de diversas moléculas diferentes no cometa, apesar do curto período de observação.
Alguns pesquisadores acham que os impactos de cometas na Terra antiga forneceu um suprimento de moléculas orgânicas que poderiam ter assistido a origem da vida. Descoberta de moléculas orgânicas complexas em Lovejoy e outros cometas dá suporte a essa hipótese.
“O resultado definitivamente promove a ideia de que os cometas carregam uma química muito complexa”, afirma Stefanie Milam, do Goddard Space Flight Center da NASA, em Greenbelt, nos Estados Unidos, uma das co-autora do artigo. “Durante o Bombardeio Pesado Tardio, cerca de 3,8 bilhões de anos atrás, quando muitos cometas e asteroides se chocavam com Terra e ganhávamos nossos primeiros oceanos, a vida não tinha que começar com apenas moléculas simples, como água, monóxido de carbono e nitrogênio”.
“Em vez disso, a vida tinha algo que era muito mais sofisticado em um nível molecular. Estamos descobrindo moléculas com múltiplos átomos de carbono”, continua a pesquisadora. “Então, agora podemos ver onde começam a se formar açúcares, bem como compostos orgânicos mais complexos, tais como aminoácidos – os blocos de construção das proteínas – ou nucleobases, os blocos de construção do DNA. Estes podem começar a se formar mais fácil do que começando com moléculas com apenas dois ou três átomos”.

Amostras do início do sistema solar

Em julho, a Agência Espacial Europeia informou que a sonda robótica pousadora Philae, de sua nave espacial Rosetta, que orbitava o cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, detectou 16 compostos orgânicos à medida que descia e pousava na superfície do cometa. Segundo a agência, alguns dos compostos detectados desempenhar papéis-chave na criação de aminoácidos, nucleobases e açúcares construtores de moléculas mais simples.
Os astrônomos acreditam que os cometas preservam material da nuvem de gás e poeira que formou o sistema solar. Estrelas explodindo (supernovas) e os ventos de estrelas gigantes vermelhas perto do fim de suas vidas produzem vastas nuvens de gás e poeira. Sistemas solares nascem quando ondas de choque de ventos estelares e outras supernovas próximas comprimem e concentram uma nuvem de material estelar ejetado até que porções densas daquela nuvem começam a entrar em colapso sob sua própria gravidade, formando uma nova geração de estrelas e planetas.
Estas nuvens contêm inúmeros grãos de poeira. O dióxido de carbono, a água e outros gases formam uma camada de gelo sobre a superfície destes grãos, assim o gelo se forma na janela do carro em noites muito frias e úmidas. A radiação do espaço potencializa reações químicas nesta camada de gelo para produzir moléculas orgânicas complexas. Os grãos de gelo se incorporam em cometas e asteroides, alguns dos quais se chocam contra planetas jovens era a nossa Terra antigamente, levando as moléculas orgânicas contidas dentro deles.
“O próximo passo é ver se o material orgânico sendo encontrado em cometas veio da nuvem primordial que formou o sistema solar ou se ele foi criado mais tarde, no interior do disco protoplanetário que rodeava o jovem sol”, explica Dominique Bockelée-Morvan, do Observatório de Paris, também co-autora do artigo. [Phys.org]